COLUNISTAS
Reforma do Código de Processo Penal - 4 - 04/06/2021
O último ponto a ser tratado sobre a proposta de reforma do Código de Processo Penal envolve questões relacionadas ao Tribunal do Júri, o qual tem a competência e responsabilidade de julgar os crimes dolosos contra a vida.
A reforma do CPP, em vez de aperfeiçoar o Tribunal do Júri, desconfigurou a primeira fase da instrução, aquela que ocorre na sala de audiência, antes do julgamento em plenário perante os jurados. É nessa fase que são colhidas provas judicializadas para que ao final o juiz analise se o fato deve ou não ser submetido à análise pelos jurados. Com a nova formatação, com a confirmação do recebimento da denúncia, o processo será levado diretamente para análise dos jurados.
Outra modificação vem com a expressa previsão de proibição de menção da prova policial no Tribunal do Júri.
Ora, em desprestígio ao trabalho realizado pela Polícia Judiciária, a proposta proíbe que a coleta de provas feita no inquérito policial seja apreciada pelo Tribunal do Júri. Há também uma outra violação: ao negar ao Conselho de Sentença a possibilidade de acessar os elementos de provas colhidos na fase investigativa, e que foram apreciados anteriormente pelo magistrado togado no juízo de admissibilidade da acusação, o projeto do novo Código de Processo Penal viola a ampla e irrestrita condição de exercício de soberania do Júri no julgamento da causa.
A votação pelos jurados também traz uma significativa alteração e rompe com a tradição e o sistema atual de sigilo das votações.
Inspirada no modelo norte-americano, o projeto determina que a absolvição ou condenação devem ser por unanimidade. Com isso, será possível saber se os jurados votaram para condenar ou para absolver. Além disso, atualmente, sete são os jurados escolhidos para o julgamento, e, sendo garantido o sigilo das votações, exige-se a maioria (4x3) para a decisão condenatória ou absolutória. Exigir a unanimidade trará graves prejuízos.
Exigir a unanimidade implica em quebrar o princípio do sigilo das votações. Se o réu for condenado ele saberá que todos os jurados o condenaram. Imagine-se o julgamento de líder de organização criminosa, responsável por graves homicídios.
Basta que um jurado tema votar pela condenação – até porque seu voto não mais será secreto – e não se chegará à unanimidade necessária, levando à dissolução do julgamento e soltura do acusado se estiver preso.
Isso vai tornar os julgamentos muito demorados e até injustos, pois prevalecerá a vontade do jurado com maior poder de convencimento sobre os demais. O júri vai virar uma prova de resistência, e é possível que alguns “desistam de sua convicção” para retomarem suas atividades. Ademais, isso pode gerar decisões arbitrárias e semeadoras de impunidade, como acolhimento de teses descabidas como legítima defesa da honra, justificando o feminicídio, e isso porque a absolvição não se dará em resposta a quesitos em que sejam votadas as teses das partes.
O projeto ainda determina um prazo para a votação (o que não há no modelo-norte americano). Se vencido o prazo não houver decisão, o julgamento será dissolvido (e sem dúvida isso importará na liberdade do réu, se preso estiver).
Não é só isso. O modelo propõe até três fases de votação pelos jurados; preliminar, ordinária e extraordinária, somente a primeira presidida pelo (a) Juiz (a) de Direito. Em um sistema complexo e burocrático, o relatório propõe criar hierarquia entre jurados (jurado-diretor e jurado-secretário).
Como se vê, as propostas de reforma do Código de Processo Penal representarão um grave prejuízo no combate ao crime neste país.